Jogos e polêmicas

- A abertura dos jogos e suas polêmicas
Embora a abertura das Olimpíadas no Rio siga com seu espaço especial no coração, Paris 2024 trouxe emoções e polêmicas. Ao longo da semana, replicou-se o trecho da abertura em que pessoas LGBTQIA+ (este boletim não saberia dizer que o são, mas a imprensa internacional assim noticiou) compunham um quadro, dizendo-se ser uma blasfêmia que fizessem uma paródia d’A Última Ceia, de Leonardo da Vinci. A suposta ofensa pareceu ser confirmada com a mensagem pouco esclarecedora da organização, dizendo que não foi a intensão ofender o sentimento religioso de cristãos.
A mensagem poderia explicar que a paródia se referia à obra “O Banquete dos Deuses", de Jan van Bijlert, que traz o deus Dionísio (ou Baco), em primeiro plano – trata-se do deus do vinho, que simboliza a alegria e a diversidade, motes que também estavam presentes em outras alegorias.
A cerimônia se encerrou com a belíssima voz de Celine Dion. A cantora convive com uma doença rara desde 2022, a Síndrome da Pessoa Rígida, e sua incrível participação fez com que uma nova fake news surgisse: a de que a doença é causada pela vacina para Covid-19. A falsidade correu tanto que foi preciso o Ministério da Saúde soltar uma nota informando que não há qualquer relação entre a doença, que é autoimune, com o mecanismo da vacina.
Tempos estranhos. Mais estranhos que as águas do rio Sena.
- E a polêmica não ficou apenas na abertura dos jogos
Uma luta de boxe reacendeu a polêmica de gênero nos esportes. Desta vez, o foco dos debates foi o corpo da atleta africana Imane Khalif, trazendo à tona questionamentos sobre os marcadores biológicos que indicam se atletas estão competindo em condições de igualdade. Esse debate não é novo. No Rio 2016, por exemplo, a atleta Caster Semenya foi alvo de polêmicas semelhantes.
O debate sobre atletas trans ou intersexo frequentemente gira em torno da superioridade de desempenho atribuída a níveis mais altos de testosterona e à memória muscular, o que pode inviabilizar a participação de algumas atletas intersexuais e homens trans - o debate público tende a focar quase exclusivamente no corpo feminino.
Recentemente, surgiram notícias de que Khalif teria cromossomos XY. Essa informação foi dada pelo presidente da IBA (organização que regulava o boxe) em 2023, mas nunca foi confirmada pela própria IBA ou qualquer outra instituição. Aliás, devido a problemas éticos, falta de regras protetivas aos atletas e outros escândalos, a IBA perdeu seu reconhecimento como reguladora do boxe.
O COI divulgou uma nota informando que Khalif é uma mulher cisgênero, e uma pesquisa rápida sobre a atleta revela que ela cresceu enfrentando a resistência de seu pai, que acreditava que o boxe não era um "esporte para mulheres". Além disso, Argélia, seu país de origem, é um dos lugares do mundo que criminaliza a comunidade LGBTQIA+.
Surgem, então, outras questões. O que seria necessário para manter atletas no mesmo patamar? Além do critério de peso, critérios hormonais ou genéticos? E no caso de questões anatômicas, como os braços maiores de Phelps? E não podemos esquecer da contínua evolução na prevenção de dopping.
Mas, e quanto a atletas trans?
Se quiser aprofundar mais, esse Boletim separou duas leituras de sugestão:
- Entrevista com Leonardo Peçanha, atleta trans, doutor em educação física:
- Artigo de Bárbara Gomes Pires, “A integridade olímpica”
- Há um direito à autotransfusão de sangue?
Não há uma disciplina de bioética que transcorra sem que alguém pergunte: “um paciente pode recusar transfusão de sangue?” A questão, claro, diz respeito às testemunhas de Jeová, e o debate é um antigo exemplo de hard case nas aulas de direito constitucional.
A possibilidade (ou não) da recusa terapêutica por motivo religioso ainda será decidida pelo STF no âmbito da ADPF 618, que ainda não foi pautada. Mas, na próxima semana, iniciará a audiência do Tema de Repercussão Geral n.º 952, que discute a possibilidade de o direito à liberdade religiosa justificar o custeio de tratamento médico indisponível na rede pública, em especial, a autotransfusão de sangue (ou “PBM”, Patient Blood Manegement). De acordo com a OMS, ao adotar o PBM, a Austrália teve uma redução de 28% da mortalidade, 21% de infecções e 15% do tempo de internação.
E aqui? Será que o PBM teria bons índices? E será que conseguiríamos implementar num país continental e com recursos escassos? O que você pensa?
Cartas para a redação!
- E a pesquisa clínica?
Seguimos sem regulação da nova Lei de Pesquisa Clínica – e, até o fechamento deste Boletim, o Congresso ainda não apreciou os vetos. Lembrando que a lei passa a valer no final deste mês.
- Eleições no CFM
As eleições no Conselho Federal de Medicina se aproximam e, com elas, muita repercussão política com cobertura da imprensa, que informa o apoio de políticos famosos a candidatos, demonstrando que a polarização política também afeta a campanha de uma autarquia de muita relevância à saúde brasileira.
- Foi publicada a Lei 14.942 que instituiu o Projeto Banco Vermelho, estabelecendo o dever de ações de conscientização em lugares públicos e premiação de projetos no âmbito do Agosto Lilás, mês destinado à conscientização para o fim da violência contra a mulher.
- Também foi aprovada a Lei 14.938/2024, que estabelece o Dia Nacional da Lembrança do Holocausto no dia 16 de abril. A propósito, se algum dia você estiver em algum memorial, lembre-se que é uma memória de luto – evite fotos polêmicas.
- TJ-MA aprova a criação da primeira vara especializada em saúde suplementar.
- O Rio de Janeiro sediou o seminário “Saúde suplementar no Brasil”, promovido pela FGV Justiça no Centro Cultural da Fundação Getulio Vargas, no Rio de Janeiro. Os debates foram cobertos pela CONJUR
- Salvia Haddad e Patrícia Marinho, A PGE do Amazonas e os Cuidados Paliativos
- Clenio Schulze, Desafios das novas tecnologias em saúde
• Hoje e amanhã: II Simpósio Carioca de Direito da Saúde;
• 23 de agosto: I Congresso Estadual de Direito Médico e da Saúde, organizado pela OAB-SC, em Florianópolis (inscrições abertas e gratuitas em: oab-sc.org.br/cursos-eventos)
• IX Congresso de Direito Médico, do CFM, nos dias 27 e 28 de agosto, em Brasília. Atenção: Até dia 09.08 é possível enviar trabalhos para publicação.
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É isso. #sextou e bora torcer pelo Brasil – este editor parou de assistir por recomendação médica e também para não dar azar aos atletas como tem dado ao Palmeiras.
Este boletim foi escrito ouvindo Sólo Le Pido a Dios, de Mercedes Sosa.